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Sorteios e representação democrática

Choice by lot and democratic representation

Resumos

Diferentes propostas de reintrodução da escolha por sorteio como forma de preencher funções políticas são estudadas. A seleção aleatória de legisladores ou governantes reduziria o impacto do poder econômico, permitiria uma representação mais fidedigna de grupos minoritários ou desprovidos de recursos políticos e promoveria o rodízio entre governantes e governados, impedindo a cristalização de uma elite oligárquica. No entanto, haveria perda de continuidade legislativa e, em especial, de responsividade dos governantes em relação aos governados. Apesar de suas debilidades, as propostas são úteis como forma de compreender os problemas da representação eleitoral e identificar suas causas.

representação política; mecanismos de representação; sorteio


Different proposals for the reintroduction of choice by lot as a way of performing political functions are studied. Selecting legislative or governing positions by chance would reduce the impact of economic power, would allow a more trustworthy representation of minority groups, and would prevent the rise of an oligarchy. However, there would occur a loss of legislative continuity and, specially, of accountability of the governing towards the governed. Despite their weak points those proposals are useful for a better understanding of the problems of electoral representation and for detecting their causes.

political representation; representation mechanisms; lot


FACES DA DEMOCRACIA

Sorteios e representação democrática* * Este artigo se beneficiou da leitura atenta e das observações acuradas do parecerista anônimo de Lua Nova, a quem agradeço. Também sou reconhecido a Regina Dalcastagnè, pelos comentários sobre todo o texto, e a Claudia Peixoto e Liliane Lustosa Pierre, pelas referências sobre o funcionamento dos tribunais de júri. As falhas e omissões permanecem sendo de minha inteira responsabilidade.

Choice by lot and democratic representation

Luis Felipe Miguel

Professor do Departamento de Ciência Política da Universidade de Brasília — UnB

RESUMO

Diferentes propostas de reintrodução da escolha por sorteio como forma de preencher funções políticas são estudadas. A seleção aleatória de legisladores ou governantes reduziria o impacto do poder econômico, permitiria uma representação mais fidedigna de grupos minoritários ou desprovidos de recursos políticos e promoveria o rodízio entre governantes e governados, impedindo a cristalização de uma elite oligárquica. No entanto, haveria perda de continuidade legislativa e, em especial, de responsividade dos governantes em relação aos governados. Apesar de suas debilidades, as propostas são úteis como forma de compreender os problemas da representação eleitoral e identificar suas causas.

Palavras-chave: representação política; mecanismos de representação; sorteio

ABSTRACT

Different proposals for the reintroduction of choice by lot as a way of performing political functions are studied. Selecting legislative or governing positions by chance would reduce the impact of economic power, would allow a more trustworthy representation of minority groups, and would prevent the rise of an oligarchy. However, there would occur a loss of legislative continuity and, specially, of accountability of the governing towards the governed. Despite their weak points those proposals are useful for a better understanding of the problems of electoral representation and for detecting their causes.

Keywords: political representation; representation mechanisms; lot

A representação política vive uma crise de legitimidade. Isto ocorre tanto em países como o Brasil, em que as instituições representativas foram restauradas há relativamente pouco tempo, quanto nas democracias "consolidadas" do hemisfério norte. Partidos tradicionais foram engolfados por escândalos de corrupção, como os democrata-cristãos italianos e alemães, os socialistas franceses, italianos e espanhóis ou os liberais japoneses. Padrões de lealdade partidária foram erodidos com rapidez, em especial após o colapso do sistema soviético, quando as disputas eleitorais deixaram de ser vistas como o momento de optar entre modelos significativamente diferentes de ordenamento social. Mas a "diferença" política renasce no outro extremo do espectro, com o crescimento, na Europa, de movimentos neofascistas e xenófobos, como a Frente Nacional francesa, de Le Pen, o Partido da Liberdade austríaco, de Jörg Haider, e a Liga do Norte italiana. Onde o voto é facultativo, a abstenção eleitoral bate recordes1 1 Nas eleições presidenciais de 1996, nos Estados Unidos, menos da metade dos cidadãos em idade de votar compareceram às urnas, o que parece indicar que se desceu mais um patamar numa tendência iniciada na década de 1960 (dados do site "Dave Leip's atlas of U.S. presidential elections", no endereço http:// uselectionsatlas.org). Para dados sobre outros países desenvolvidos, ver Manuel Castells. O poder da identidade. Trad, de Klauss Brandini Gerhardt. São Paulo. Paz e Terra, 1999, pp. 401-8. No Brasil, mesmo com a obrigatoriedade do voto, a abstenção no primeiro turno das eleições gerais de 1998 alcançou 21,49%; somando-se a ela os votos brancos e nulos, 36,17% dos eleitores registrados declinaram do direito de escolher o presidente da República. . Nenhum destes indícios é, por si só, conclusivo; em conjunto, porém, sinalizam com bastante clareza o alheamento, em relação ao sistema político, de parcelas significativas das populações dos países com regime de tipo ocidental. Outro sintoma aparece no resultado de diversas pesquisas de opinião, em diferentes países, que mostram baixa confiança no políticos e no Parlamento2 2 Embora sejam, por vezes, encarados como uma "verdade" já pronta, os resultados de tais pesquisas precisam ser interpretados com cuidado. De qualquer forma, são um indício eloqüente do alheamento político. No caso brasileiro, para a manifestação do sentimento de que os políticos não representam os interesses de seus eleitores, ver os dados em José Álvaro Moisés, Os brasileiros e a democracia. S. Paulo: Ática, 1995, p. 207. Para dados referentes aos Estados Unidos, ver David B. Magleby e Kelly D. Patterson, "Congressional reform". Public Opinion Quaterly. vol. 58, nº 3. Chicago, 1994, pp. 419-27 (ver tabelas às pp. 423-4). . Os cidadãos se sentem cada vez menos representados — e nisto, precisamente, reside a crise da representação política.

Não se trata de um fenômeno passageiro, mas de um quadro que se agrava há cerca de quatro décadas. Um ponto-chave para entendê-lo é a consciência crescente de que os corpos de representantes não são representativos (como amostragem) do conjunto da representação. Há, na esmagadora maioria dos parlamentos do mundo, uma participação desproporcional de homens, integrantes da etnia dominante, proprietários, com educação superior e renda maior do que a média. Nunca foi diferente, e antes a disparidade era até maior: a novidade é o crescimento das manifestações de descontentamento com a situação. Entender esta desproporção como um grave problema político parece indicar a valorização daquilo que Anne Phillips chamou de "política da presença"3 3 Anne Phillips, The Politics of Presence. Oxford: Oxford University Press, 1995. ; isto é, a idéia de que os mecanismos eleitorais de accountability (responsividade dos eleitos perante seus eleitores) não são suficientes e que os grupos minoritários precisam estar representados fisicamente para que seus interesses sejam levados em conta.

Contra esta distorção na representação, uma solução que vem sendo adotada em inúmeros países, inclusive o Brasil, é a fixação de quotas de candidaturas — em geral, obrigando os partidos a indicarem uma porcentagem mínima de mulheres candidatas. Os resultados efetivos têm variado de experiência para experiência, devido a diversos fatores, marcadamente as diferenças nos sistemas eleitorais. As quotas têm sido usadas também com o intuito de minorar a desigualdade de oportunidades no acesso ao mercado de trabalho e ao ensino superior, sobretudo nos Estados Unidos. A polêmica sobre a "ação afirmativa" é grande; seus críticos julgam que, sob o pretexto de favorecer a igualdade entre os grupos sociais, ela fere direitos individuais fundamentais.

Além disso, as quotas podem causar "efeitos colaterais" indesejados, que precisam entrar no cálculo a respeito da conveniência ou não de sua adoção. O mais importante deles é a perpetuação da relevância política das diferenças que pretende abolir. Isto é, quer-se gerar uma sociedade na qual sexo e cor da pele não sejam handicaps para se entrar no parlamento ou na universidade, mas, ao mesmo tempo, origem-se sexo e cor da pele como critérios prioritários de admissão. Por fim, as quotas se prestam bem à aplicação sobre variáveis discretas (sexo ou crença religiosa), mas não sobre variáveis contínuas (cor, classe social e renda, por exemplo)4 4 Para uma discussão sobre este ponto, ver Anne Phillips, Democracy and Difference. University Park: The Pennsylvania State University Press, 1993, p. 100. .

Este artigo vai explorar uma outra espécie de proposta de superação dos problemas atuais da representação política, mais extrema e (exatamente por isto) até o momento não implementada. São projetos de substituição parcial das eleições por sorteios, que têm aparecido com freqüência na literatura anglo-americana recente. Do ponto de vista da organização política das democracias representativas, são extravagâncias; muitos deles são mesmo fantasistas e pouco exeqüíveis. Mas o fato da loteria estar sendo discutida a sério, por pensadores respeitados, revela o desencanto com o mecanismo eleitoral, visto como possuidor de vícios graves (sub-representação das minorias, oligarquização, susceptibilidade à influência do dinheiro, passividade dos governados) e que não podem ser sanados dentro dos marcos de sua própria lógica.

SORTE E MÉRITO

A rigor, trata-se do ressurgimento da idéia de sorteio, já que a seleção aleatória dos magistrados era regra corrente na democracia grega e permaneceu presente nas cidades-Estado republicanas italianas até o Renascimento. Longe de ser uma característica marginal, o sorteio era um dos traços definidores da democracia, tal como entendida desde os filósofos gregos até, pelo menos, o século 18. A frase de Montesquieu resume esta concepção: "O sufrágio pela sorte faz parte da natureza da democracia; o sufrágio por escolha, da natureza da aristocracia"5 5 Montesquieu, De I'esprit des lois, livro II, capítulo II; cito de CEuvres complètes, t. II. Paris: Gallimard, 1951, p. 242. . Anos depois, Rousseau, pregando a democracia direta como forma de Estado, não hesitava em classificar como "aristocrático" o governo que preferia, e que era eletivo6 6 Jean-Jacques Rousseau, Du contraí social, livro III, capítulo V; cito de (Euvres completes, t. III. Paris: Gallimard, 1964, pp. 406-7. O Estado proposto por Rousseau é uma democracia direta porque reside no povo, sem intermediários ou representantes, o poder de fazer as leis; para ele, o governo é apenas um órgão executivo. .

Para alguns autores, a instituição do sorteio, na democracia grega, está ligada a suas crenças religiosas. A formulação clássica desta teoria foi dada, no século 19, por Fustel de Coulanges, para quem os cidadãos "persuadiam-se de que os deuses sempre lhes designavam os mais dignos quando faziam sair um nome da urna"7 7 Fustel de Coulanges, A cidade antiga. Trad, de Fernando de Aguiar. 4ª ed. S. Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 198. . Mas esta interpretação está desacreditada há muito tempo8 8 Bernard Manin, The Principles of Representative Government. Cambridge: Cambridge University Press, 1997, pp. 26-7. . O sorteio dos governantes foi uma instituição laica, vinculada a dois postulados centrais para a concepção grega da democracia: a igualdade fundamental entre todos os homens e o princípio do rodízio entre governantes e governados, isto é, que cada cidadão deveria governar e ser governado, alternadamente.

Contra isto, ergueu-se a crítica platônica da democracia, sustentada na idéia de que existem diferenças significativas de competência entre os diversos indivíduos e que, portanto, a condução do governo deveria ser destinada aos melhores. Numa parábola famosa, Platão compara o Estado a um navio; na democracia, ele careceria de um bom comandante, ficando à mercê dos palpites dos simples marinheiros e da luta entre os grupos que disputam o poder9 9 Platão, A República, 488a-e; cito da tradução de Carlos Alberto Nunes. Belém: UFPA, 1988, pp. 248-9. O mesmo tipo de argumento aparece em outro diálogo platônico, o Protagoras. . Tratar-se-ia, portanto, de reconhecer que os homens são desiguais e de dazr o comando aos mais capacitados, deixando de lado a fantasia perniciosa da rotação entre governantes e governados.

Ao optarem pela eleição como forma de seleção dos governantes, os fundadores dos regimes eleitorais mostravam-se sensíveis à crítica platônica e introduziam um elemento aristocrático. Conforme demonstrou Bernard Manin, a "democracia representativa" não foi pensada como uma solução técnica para a impossibilidade da democracia direta em sociedades extensas, mas como forma de gerar um corpo governante superior, em qualidade, ao conjunto do povo —uma aristocracia10 10 Manin, op. cit.; ver, em especial, o capítulo 3, "The principle of distinction" (pp. 94-131). . Isto não quer dizer que propostas de "representação descritiva"11 11 Ver, sobre a questão, o livro seminal de Bernard Manin, citado. É possível dizer que a representação proporcional, que encontraria importantes advogados a partir do século 19, em especial Stuart Mill (e, no Brasil, José de Alencar), é "descritiva", na medida em que se propõe ser urna amostra, razoavelmente exata, da divisão das opiniões no seio do eleitorado. No entanto, permanece a indiferença quanto à similaridade de composição social entre o corpo de representantes e seus constituintes. Aliás, o próprio Stuart Mill propunha a adoção de artifícios que garantissem a super-representação das minorias instruídas (cf. John Stuart Mill, Considerações sobre o governo representativo. Trad, de E. Jacy Monteiro. 3ª ed. S. Paulo: Ibrasa, 1995, pp. 116-21). , isto é, do corpo de representantes como uma miniatura perfeita do povo, não tenham surgido. Mas foram vozes minoritárias, seja nos debates sobre a Constituição dos Estados Unidos, seja na Constituinte francesa12 12 O conceito remete a Hanna Fenichel Pitkin, The Concept of Representation. Berkley: University of California Press, 1967; ver o capítulo 4, "Standing for: descriptive representation" (pp. 60-91). .

Assim, no "Federalista nº 35", Hamilton expressa sua confiança na sub-representação das classes trabalhadoras: "Mecânicos e manufatureiros sempre estarão inclinados, com poucas exceções, a dar seus votos para comerciantes, de preferência a pessoas de suas próprias profissões ou ocupações"13 13 Alexander Hamilton, James Madison e John Jay, The Federalist. Chicago: Encyclopaedia Britannica, 1990, p. 113. . Outra formulação do princípio aristocrático aparece no "Federalista nº 57": "O objetivo de qualquer constituição política é, ou deve ser, primeiro, conseguir, para governantes, homens que possuam mais sabedoria para discernir, e mais virtude para perseguir o bem comum da sociedade"14 14 id., pp. 176-7. O texto é atribuido a Hamilton ou Madison. .

Não há tensão entre a distinção de classe, presente na primeira citação, e a de sabedoria e virtude, na segunda: os autores seguramente acreditavam que as classes superiores eram mais sábias e mais virtuosas. Seja como for, o corpo de representantes é distinto do povo. É um corpo selecionado, onde se apresenta não um retrato da sociedade, mas aquilo que nela haveria de melhor. O regime representativo, portanto, seria superior à democracia direta. E possível, como faz Ellen Meiksins Wood, ler o argumento dos escritos federalistas pelo avesso da inteipretação corrente: não é a representação que é necessária porque a república é extensa, mas uma república extensa que é desejável por tornar a representação inevitável15 15 Ellen Meiksins Wood, Democracy against Capitalism: Renewing Historical Materialism. Cambridge: Cambridge University Press, 1995, p. 216. .

A defesa da superioridade intrínseca do governo representativo vai culminar, no século 19, no pensamento de John Stuart Mill. Nele, são perceptíveis as tensões entre os aspectos democráticos e aristocráticos da combinação. Fiel à máxima utilitarista de que cada um é o melhor juiz dos próprios interesses, ele precisa dar espaço à participação política de todos. Por outro lado, há o medo da "tirania da maioria", que se traduz concretamente no "duplo perigo" causado pela predominância de trabalhadores manuais no eleitorado — perigo do "padrão demasiadamente baixo da inteligência política" e da "legislação de classe"16 16 John Stuart Mill, Considerações sobre o governo representativo. Trad, de E. Jacy Monteiro. 3ª ed. S. Paulo: Ibrasa, 1995, p. 115. . Assim, a representação deveria favorecer as minorias e, em especial, uma minoria específica: as classes proprietárias (e cultas).

Afastado o risco próprio à democracia, o sistema representativo poderia revelar todos os seus méritos, o mais importante dos quais seria o amplo desenvolvimento dos talentos individuais, proporcionado pela participação política (eleitoral). Ao se envolver nos debates públicos, para escolher seu representante, o cidadão comum sairia do casulo de seus negócios privados, ampliaria seus horizontes, ganharia um conhecimento maior da sociedade. Tudo isto repercutiria de maneira positiva na vida cotidiana. Os indivíduos se tornariam mais ativos e mais capazes. Por isso, a democracia representativa é, para Stuart Mill, a melhor forma de governo, mesmo que por vezes chegue a decisões errôneas e possa mostrar déficits de competência. Um despotismo esclarecido e bem-intencionado, mesmo que fosse possível garantir tais atributos, geraria apatia e passividade na população, já que todas as decisões viriam prontas de cima. Por outro lado, uma democracia direta, caso se pudessem superar os obstáculos físicos à sua consecução, tomaria demasiado tempo e energia dos cidadãos, impedindo que se dedicassem às atividades produtivas.

DO JÚRI AO APOCALIPSE

É no âmbito do poder judiciário que os sorteios continuam presentes, no funcionamento burocrático (distribuição dos processos, por exemplo) e, caso mais relevante, na instituição do júri popular. Herança da common law inglesa, o júri é adotado em diversas democracias contemporâneas, inclusive no Brasil. A Carta de 1988, seguindo a tradição constitucional brasileira, estatui o júri e lhe assegura "a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida" (art. 5º, XXXVIII, d). A idéia é que o acusado seja julgado por pessoas de sua própria comunidade, que compartilham de um mesmo código moral e não tenderiam, como os juizes profissionais, a um rigor excessivo. Montesquieu já observava que "é necessário que os juizes sejam da condição do acusado, ou seus pares, para que ele não possa imaginar que está à mercê de pessoas inclinadas a lhe fazerem violência"17 17 Montesquieu, op. cit., livro XI, capítulo VI (p. 399 da edição indicada). . Também está presente a crença de que o bom senso, qualidade que todas as pessoas possuem, é suficiente para o discernimento da culpa e da inocência.

No entanto, a instituição do júri está longe de ser uma unanimidade. Seus críticos são sensíveis, em especial, ao argumento da competência. Classificado de julgamento "ditado pelo arbítrio e pela intuição cega", é contrastado ao do juiz profissional, "inspirado na lei e na razão, no direito e no conhecimento técnico"18 18 José Frederico Marques, A instituição do júri, vol. 1. S. Paulo: Saraiva, 1963, p. 5. . Ou, segundo a frase de efeito de Émile Faguet, "o Júri nada mais é do que o requinte do culto da incompetência"19 19 Apud Alcides de Mendonça Lima, "Júri: instituição nociva e arcaica". Revista Forense, nº 196. Rio de Janeiro, 1961, pp. 16-24 (citação à p. 19). . O cidadão comum seria incapaz de compreender a lei ou avaliar as evidências, sendo presa fácil da emocionalidade e do jogo teatral dos advogados.

Mas a vinculação dos júris com a crença democrática da igualdade de todos é, no mínimo, problemática. Há uma tensão entre a idéia de que os jurados devem ser representativos (no sentido amostrai) da população, ou, pelo contrário, serem "cidadãos exemplares"20 20 Sobre a questão, ver Barbara Goodwin, Justice by Lottery. Chicago: The University of Chicago Press, 1992, pp. 163-7; Akhil Reed Amar, "Chosing representatives by lottery voting". The Yale Law Journal, vol. 93, nº 7. New Haven, 1984, pp. 1287-8; Jon Elster, Salomonic Judgements. Cambridge: Cambridge University Press, 1989, pp. 93-103. . O Código de Processo Penal brasileiro, instituído em 1941, afirma que "os jurados serão escolhidos dentre cidadãos de notória idoneidade" (art. 436, caput), deixando a interpretação da expressão ao arbítrio do juiz-presidente do júri, que alista anualmente os jurados a serem sorteados, "sob sua responsabilidade e mediante escolha por conhecimento pessoal ou informação fidedigna" (art. 439, caput). Ao mesmo tempo em que exige a "notória idoneidade", a lei estabelece que "o exercício efetivo da função de jurado ...estabelecerá presunção de idoneidade moral", garantindo prisão especial e preferência nas concorrências públicas (art. 437).

O exercício da função de jurado é obrigatória para os cidadãos entre 21 e 60 anos, com isenção para certos profissionais e ocupantes de cargos públicos, além das "mulheres que não exerçam função pública e provem que, em virtude de ocupações domésticas, o serviço do júri lhes é particularmente difícil" (art. 436, § único, IX). Embora a lei seja omissa, são excluídos também surdos-mudos, cegos e analfabetos21 21 Marques, op. cit., p. 91. . Trata-se, portanto, de uma escolha cuja aleatoriedade é bastante limitada. Em outros países, como a Grã-Bretanha, as relações de eleitores servem de base para o sorteio de jurados; neste caso, o viés na composição do júri tende a seguir o eventual viés do alistamento eleitoral22 22 Goodwin, op. cit., p. 164. .

Existem outros casos em que a utilização do sorteio é considerada aceitável, em especial quando os bens a serem distribuídos não podem ser repartidos e a situação é de incerteza decisoria ou há a crença na igualdade dos participantes. É discutida sua implementação para resolver o problema da destinação de recursos médicos escassos23 23 Elster, op. cit., p. 73. , o que pode parecer cruel, mas não o é mais do que a maneira habitual de alocar tais recursos, destinando-os a quem pode pagar — e com a vantagem de ser mais eqüitativo. Outro exemplo extremo, mas ficcional, está no filme hollywoodiano "Impacto profundo", dirigido por Mimi Leder (1998). Diante de uma catástrofe anunciada, o choque de um cometa com a Terra, o governo estadunidense promove uma loteria nacional, envolvendo todos os cidadãos, para preencher 800 mil vagas em abrigos subterrâneos. Está subjacente a idéia de que todos possuíam igual direito à vida24 24 Em termos, já que outros 200 mil lugares haviam sido destinados, de antemão, para as elites políticas, militares, científicas e intelectuais. E só eram qualificados para o sorteio os menores de 50 anos, em função da necessidade de repovoar o planeta após a colisão. ou, caso contrário, que não haveria tempo hábil para fazer uma seleção justa dos mais merecedores — ou que ninguém desejaria assumir a responsabilidade moral por tal escolha.

Num caso destes, o sorteio se mostra intuitivamente mais atraente do que outras formas de seleção. Basta contrastar a solução dada em Impacto profundo a outra fantasia apocalíptica, o romance clássico de ficção científica de Mordecai Roshwald, Plano sete25 25 Mordecai Roshwald, Plano sete. Trad, de Alfredo Margando. Lisboa: Livros do Brasil, s.d. A edição original é de 1959. , uma crítica à guerra fria. Também se trata da distribuição de lugares em abrigos subterrâneos, desta vez no contexto de uma guerra atômica. Em vez de loteria, os lugares são atribuídos segundo a hierarquia social, com as classes dirigentes (a começar pelos chefes militares) sendo alojadas nos níveis mais profundos, mais confortáveis e mais seguros. O caráter elitista e antidemocrático do procedimento é evidente.

ACCOUNTABILITY E REPRESENTAÇÃO

As propostas contemporâneas de reintrodução da loteria como forma de escolha de governantes defrontam-se com três objeções básicas. A primeira, já vista, é a que repercute de maneira mais intensa no senso comum: a descrença na premissa democrática da igualdade entre todos. A segunda está ligada à idéia da eleição como autorização para que o representante aja em nome dos representados. A rigor, esta não é uma objeção muito séria, já que hoje se considera que a autorização é dada mesmo por aqueles que votaram nos candidatos derrotados. Ou seja, a participação no processo eleitoral significaria que há concordância quanto à justeza do processo de escolha, o que poderia valer também para o sorteio.

A terceira objeção se refere à accountability, isto é, o fato de que os representantes são responsáveis perante seus constituintes26 26 Deixo de levar em conta, aqui, a distinção que paite da literatura especializada faz entre accountability e responsividade (responsiveness); ver Adam Przeworski, Susan C. Stokes e Bernard Manin, "Introduction", em id. (eds.), Democracy, Accountability, and Representation. Cambridge: Cambridge University Press, 1999, pp. 9-10. . Ela seria eliminada se os governantes não devessem seus mandatos à vontade expressa da maioria da população, mas ao simples acaso. Seria grave a ausência da disputa eleitoral, em que os candidatos enunciam seus pontos de vista, e, sobretudo, da sanção facultada aos cidadãos, que é a possibilidade da não-recondução de seus representantes ao cargo.

Este é o ponto crucial, já que todas as propostas de reintrodução do sorteio estão ancoradas num mesmo diagnóstico: a inoperância (ou, pelo menos, insuficiência) dos mecanismos de accountability eleitoral. A busca da eleição e da reeleição não torna os políticos especialmente sensíveis à vontade do cidadão comum, e sim dos "grandes eleitores" — controladores de máquinas políticas locais, grupos de mídia e financiadores de campanha. Por outro lado, o papel limitado que o sistema concede ao simples cidadão, condenado a dissolver seu voto em meio a milhares ou milhões de outros, não poderia promover a participação ativa visada por Stuart Mill, mas apenas, como de fato ocorreu, o desinteresse e a passividade27 27 Pelo menos desde os anos 1940, com os trabalhos de Schumpeter e Lazarsfeld, há o reconhecimento da indiferença, "típica" do eleitor comum. A interpretação dada ao fato varia: é um efeito da "natureza humana", um componente necessário à estabilidade do sistema político (que, de outra forma, seria excessivamente tensionado) ou, numa leitura mais crítica, a conseqüência de certos vieses estruturais deste mesmo sistema. Para dua diferentes abordagens desta última corrente, ver Pierre Bourdieu, La distinction. Paris: Minuit, 1979, cap. 8: "Cultures et politique", e Claus Offe, "Dominação de classe e sistema político: sobre a seletividade das instituições políticas", em Problemas estruturais do Estado capitalista. Trad, de Barbara Freitag. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1984. .

Com o sorteio, o escolhido deixa de depender dos grupos poderosos, que perderiam influência política. O contra-argumento é que, sem a sanção da não-reeleição, o governante estaria muito mais exposto às tentações da corrupção e do exercício do poder em benefício próprio. A resposta, em parte, estaria em outro benefício esperado do sorteio: o rodízio de cidadãos nos cargos de governo. Um dos problemas relacionados à democracia representativa é precisamente o fato de que os representantes, ao se especializarem nesta função, desenvolvem interesses particulares, diferentes daqueles de seus constituintes — o fenômeno que, há quase 90 anos, Robert Michels chamou, com exagero retórico, de "a lei de ferro da oligarquia"28 28 Robert Michels, Sociologia dos partidos políticos. Trad, de Arthur Chaudon. Brasília: Editora UnB, 1982, sobretudo a sexta parte (pp. 215-43). . Com a escolha ao azar, deixa de existir o político profissional. Cada mandato será, provavelmente, o único daquele indivíduo. Ou seja, seu interesse a médio e longo prazos não é o interesse do governante, mas do governado que em breve voltará a ser. Este era um elemento não-desprezível na arquitetura da pólis grega.

Com este rodízio nas funções públicas, aumentaria em muito o número daqueles que teriam alguma experiência de governo. Cada cidadão ou cidadã já teria cumprido um mandato ou estaria na expectativa de cumpri-lo. No seu ambiente de moradia e de trabalho, encontraria muitos outros na mesma situação. Isto geraria o interesse e a qualificação políticas, que se contrapõem à apatia e à passividade próprias dos regimes eleitorais.

Uma última vantagem da seleção aleatória é a garantia de representatividade (no sentido mimético) da população. Com base na lei dos grandes números, é possível afirmar que haverá uma proporcionalidade aproximada dos diferentes setores no corpo governante. A busca de uma proporcionalidade mais estrita, com a aplicação de técnicas de amostragem, coloca problemas idênticos aos das quotas, já que teriam que ser definidas a priori tanto as clivagens sociais relevantes quanto a alocação de cada indivíduo dentro dos grupos.

UM PARLAMENTO TÍPICO

As propostas para a incorporação do sorteio são variadas. Em algumas, trata-se apenas de incorporar um novo elemento lateral de aleatoriedade aos já existentes nos sistemas eleitorais atuais29 29 Entre os elementos aleatórios presentes no processo eleitoral brasileiro, por exemplo, estão a determinação do número de identificação dos partidos e, dentro destes, dos candidatos às eleições proporcionais; a ordem de aparição dos partidos e coligações na propaganda eleitoral no rádio e na TV; e (onde não há urna eletrônica) o ordenamento dos nomes na cédula de votação. . É o caso da proposta, nos Estados Unidos, de determinar pela sorte quais serão os primeiros eventos para a indicação dos candidatos à presidência, para evitar o impacto psicológico causado pelos resultados do caucus (convenção aberta) de Iowa e das primárias de New Hampshire30 30 A proposta é do ex-vice-presidente Walter Mondale. Apud James S. Fishkin, Democracy and Deliberation: New Directions for Democratic Reforms. New Haven: Yale University Press, 1991, p. 10. ; ou de fixar ao azar a data das eleições, impedindo a manipulação do calendário das políticas públicas por parte dos governantes31 31 A. Lindbeck, apud Jon Elster, op. cit., p. 91. . Em outras, é prevista uma transformação radical da sociedade, como na provocativa proposta de Barbara Goodwin, de fazer do sorteio o meio universal de alocação de recursos escassos, a começar pelas posições de poder e prestígio.

A autora observa que, hoje, tais recursos são "resolvidos" por mecanismos de mercado, em prejuízo sistemático dos mais pobres e mais fracos. Isto é, em si, o resultado de uma loteria — a loteria do nascimento, que determina a posição inicial de cada indivíduo e, assim, em grande medida, suas chances na sociedade32 32 Goodwin, op. cit., p. 178. . A instituição de um sorteio "às claras" e periódico seria mais justa para todos. Cargos públicos, riquezas materiais e empregos atraentes seriam distribuídos aleatoriamente (e por prazo determinado). Na visão de Goodwin, esse método é mais imparcial, dando a todos oportunidades idênticas. Ao mesmo tempo, como existiriam diferentes posições de poder, prestígio e prosperidade, estaria garantida a diversidade social, evitando os males de um igualitarismo extremado.

Para a discussão aqui empreendida, interessam mais as propostas com amplitude intermediária — aquelas que introduzem elementos aleatórios significativos nos processos de seleção dos ocupantes das funções políticas. O caminho mais simples é o apresentado por Callenbach e Phillips, que propõem que a câmara baixa (nos Estados Unidos) seja composta por 435 cidadãos sorteados entre a população33 33 Ernest Callenbach e Michael Phillips, A Citizen Legislature. Berkeley: Banyan Tree, 1985. . Isto garantiria a formação de um corpo de representantes que fosse "típico" do conjunto do povo, com a presença proporcional de seus diversos subgrupos, aí incluídos negros, mulheres e outros setores hoje sub-representados. A influência do dinheiro na escolha dos legisladores seria anulada.

Existe uma premissa, na proposta de Callenbach e Phillips (e na defesa da seleção por loteria, em geral), que merece discussão. Para eles, há uma identificação automática entre a posição social e os interesses que o indivíduo possui. Isto é, qualquer mulher que seja sorteada estará capacitada a falar em nome do conjunto das mulheres; qualquer negro representa os interesses dos negros e assim por diante. Na verdade, a própria idéia de que existem interesses objetivamente identificáveis, ligados às diversas posições sociais, é questionável. Mulheres, negros ou integrantes de qualquer outro grupo social, subalterno ou dominante, podem discordar sobre quais são seus reais interesses ou qual tipo de medida política os beneficia34 34 Eleni Varikas, "Refundar ou reacomodar a democracia? Reflexões críticas acerca da paridade entre os sexos". Estudos Feministas, vol. 4, nº 1. Rio de Janeiro. 1996, pp. 65-94; ver pp. 79-81. . Falta à proposta, portanto, a reflexão sobre a construção das identidades coletivas. Sem um espaço no qual os grupos sociais possam pensar a si mesmos e às políticas que desejam, a legislatura aleatória não passará de um punhado de indivíduos atomizados.

Os autores se mostram conscientes de outros problemas associados à proposta. O rodízio de legisladores, próprio à escolha aleatória, provocaria perda de continuidade política. Mais grave, já que cada legislatura empossaria um time completo de novatos, a inexperiência coletiva seria enorme, ampliando o poder relativo da burocracia profissional — um poder que reside precisamente em seu conhecimento especializado superior. Embora argumentem que tais problemas seriam menores, diante dos ganhos esperados com a educação política popular e a neutralização de influências espúrias, Callenbach e Phillips mantêm a disputa eleitoral para o Senado, além dos cargos executivos. Desta forma, os defeitos inerentes a cada um das formas de seleção (sorteio e eleição) seriam contrabalançados pela existência da outra casa legislativa, escolhida por um método diferente.

Mais cauteloso é o cientista político Robert Dahl, conhecido por seu conceito de "poliarquía" (regimes pluralistas, competitivos e abertos à participação) como a melhor aproximação possível ao ideal democrático de governo do povo. Dahl vem esboçando algumas alternativas para o aperfeiçoamento das poliarquías existentes; uma delas seria a criação do que chamou de "minipopulus" Como o nome já indica, seriam miniaturas da população, escolhidas por sorteio. Numa formulação da proposta, no livro Democracy and its Critics, haveria um minipopulus que decidiria a agenda de questões relevantes e uma série de outros que debateriam, cada, um dos temas indicados. Sua abrangência poderia ser local, regional ou nacional, sem custos operacionais significativos ou grandes transtornos para seus integrantes, já que as reuniões seriam via telecomunicações. Da mesma forma, especialistas e funcionários públicos poderiam ser consultados, reduzindo o nível de incompetência decisória associado à seleção lotérica. Dahl imagina que cada minipopulus seria integrado por mil cidadãos e que o prazo de um ano para alcançar uma decisão seria razoável.

Nesta formulação, é esclarecido apenas que a instituição dos minipopulus não é vista "corno um substituto dos corpos legislativos, mas como um complemento"35 35 Robert A. Dahl, Democracy and its Critics. New Haven: Yale University Press, 1989, p. 340. . Uma explicação mais detalhada é apresentada em After the Revolution?, onde os corpos escolhidos por sorteio são descritos como órgãos consultivos vinculados aos funcionarios eleitos de todos os níveis, no executivo e no legislativo36 36 Robert A. Dahl, After the Revolution? Authority in a Good Society. Revised edition. New Haven: Yale University Press, 1990, pp. 122-3. . Ou seja, seu poder decisorio é nulo. A eleição permanece como a forma fundamental de alocação de poder político.

No entanto, Dahl havia avançado a tese — contestável e ingênua — de que o veredito determinado pelo minipopulus, auxiliado pelos experts que estariam à sua disposição, "seria o veredito do próprio demos, se o demos fosse capaz de levar em conta o melhor conhecimento disponível para decidir quais políticas eram mais apropriadas para alcançar os fins que visasse"37 37 Dahl, Democracy and its critics, cit., p. 340. . Neste caso, porque não dar a ele a força da lei? Dahl responde alegando a reduzida competência dos cidadãos sorteados, o que é contraditório com a afirmação anterior; a ineficiência de conselhos tão numerosos e que, também devido à inexperiência política, demandariam muito tempo para chegar a resultados; e o risco de uma seleção desviante, que pode ser estatisticamente desprezível, mas é real38 38 Dahl, After the revolution?, cit., pp. 122-5. Cabe observar que, fora pequenas correções de forma, Dahl optou por manter inalterada a seção sobre sorteio na edição revisada de seu livro. Cf. a versão original: Robert A. Dahl, After the Revolution? Authority in a Good Society. New Haven: Yale University Press, 1970, pp. 149-53. .

Em suma, trata-se de uma proposta tímida, que restringe o papel do sorteio para preservar a accountability dos governantes em relação aos governados. Os órgãos consultivos, com integrantes escolhidos de forma aleatória, serviriam sobretudo de contraponto às assembléias eletivas, detentoras de poder. O divórcio entre os resultados dos trabalhos de uns e outras estaria demonstrando o distanciamento entre a elite política e a população que ela deveria representar. Mas isto poderia ser interpretado tanto como um sintoma da oligarquização desta elite, que defenderia interesses diferentes daqueles de seus constituintes, quanto como um sinal de sua superior competência para tratar dos assuntos políticos, cuja sutileza e complexidade não são acessíveis ao cidadão comum.

A "VOTAÇÃO LOTÉRICA"

Uma mistura engenhosa de sorteio e votação foi proposta por Akhil Reed Amar sob o nome de "votação lotérica" (lottery voting)39 39 Amar, op. cit., pp. 1283-308. . Trata-se de um modelo destinado a favorecer a representação de minorias que estejam dispersas geograficamente, mantendo, quanto ao resto, o sistema eleitoral vigente nos Estados Unidos, o chamado "voto distrital" (eleição majoritária em circunscrições uninominais). O voto distrital prejudica tais minorias, já que um determinado grupo, mesmo que seja bastante significativo, pode ficar sem nenhum representante, caso não seja majoritário em nenhum distrito. Para remediar o problema, às vezes se utiliza o gerrymandering, a prática de redesenhar as circunscrições eleitorais para gerar uma determinada maioria; nos EUA, foi o expediente experimentado para acomodar grupos raciais40 40 Ver A. Phillips, The politics of presence, cit., capítulo 4, "Race-conscious districting in the USA" (pp. 85-114). . Mas a legitimidade de tal procedimento é maculada por seu excessivo artificialismo e caráter manipulatório. Sua história está mais associada à busca da criação de feudos eleitorais inexpugnáveis por chefes políticos locais do que ao intento, mais simpático, de proteger minorias.

Pela votação lotérica, há primeiro uma eleição e em seguida um sorteio, no qual cada candidato tem tantas chances quantos votos recebeu. Isto é, se um determinado candidato obteve 30% dos votos, terá 30% de chance de ser sorteado. Em alguns casos, candidatos minoritários seriam declarados vitoriosos, mas, no cômputo geral, a estatística nos diz que a composição da assembléia estaria próxima da representação proporcional. Se, em cem distritos, os candidatos do grupo X obtiveram 30% dos votos, é de esperar que, no final, cerca de 30 candidatos deste grupo estejam entre os cem sorteados.

O principal resultado é a representação justa das minorias eleitorais. Mas a votação lotérica também gera novos incentivos à participação eleitoral, pelo simples fato de que cada voto passa a contar. O candidato que sabe contar com 51% dos eleitores não pode se sentir seguro da vitória; pelo contrário, precisa ampliar sua margem, para aumentar suas chances. Ou seja, ele também precisará levar em conta as minorias, para conquistá-las. Da mesma forma, o eleitor que sabe antecipadamente que seu candidato preferido possui a maioria (ou, pelo contrário, não tem como alcançá-la) não sente seu voto como inútil41 41 Amar, op. cit., p. 1299. . A racionalidade da apatia eleitoral, devido ao peso insignificante do eleitor individual, que Olson procurou demonstrar42 42 Mancur Olson, The logic of Collective Action: Public Goods and the Theory of Groups. Cambridge (MA): Harvard University Press, 1965. , seria minada pela votação lotérica.

Com base nas características de seu modelo, Amar afirma que a votação lotérica é uma forma de representação proporcional. Cabe indagar, então, porque não adotar a representação proporcional tradicional, que ele chama de "votação cumulativa"43 43 A rigor, o "voto cumulativo" é um sistema eleitoral majoritário, de voto múltiplo, utilizado por mais de um século no Estado de Illinois (ver José Antônio Giusti Tavares, Sistemas eleitorais nas democracias contemporâneas. Rio de Janeiro: Relume-Damará, 1994, p. 91). Amar, no entanto, usa a expressão em sentido diferente, para se referir à representação proporcional tradicional. . Ele faz um balanço das vantagens relativas dos dois sistemas, reconhecendo que a votação lotérica diminui a possibilidade de reeleição de legisladores, o que reduz o acúmulo de experiência no parlamento — e este viés atingiria em especial os pequenos partidos. Além disso, gera descompasso entre voto e representação, já que um eleitor cujo candidato preferido não é sorteado em seu distrito seria "compensado" pela escolha de outro candidato, do mesmo grupo, porém em outro local.

Mas as vantagens do modelo são, aos olhos do autor, compensadoras. A votação cumulativa, com suas amplas circunscrições plurinominais, exige campanhas eleitorais custosas e fortes máquinas partidárias. A votação lotérica, ao contrário, preservaria as vantagens do voto distrital, como a relação mais próxima entre os candidatos e os eleitores locais. Amar destaca, em especial, as "implicações teóricas" (melhor seria dizer "simbólicas") de seu projeto, que chama a atenção para as noções de que "todos os votos devem contar igualmente, de uma forma que não ocorre hoje; que uma maioria local de 51% não dá direito a vencer 100% do tempo; e que representantes atualmente eleitos muitas vezes não representam 'o povo' de seus distritos locais, mas apenas uma parte"44 44 Amar, op. cit., p. 1301. .

Dada a intenção de gerar proporcionalidade entre os diferentes grupos, o sistema é aplicável a todo o tipo de órgão colegiado, mas não para as chefias dos poderes executivos — afinal, o risco do sorteio eventual de um único "excêntrico" para o governo é bem maior do que o do sorteio de uma maioria de "excêntricos" num parlamento45 45 Id., p. 1303. . O autor também alerta para a possibilidade do modelo degenerar em pura loteria, com todos os eleitores apresentando suas próprias candidaturas e tendo, cada um, apenas o próprio voto. A solução seria a fixação de uma barreira de exclusão, determinando que só seriam elegíveis para o sorteio aqueles candidatos que tivessem obtido um percentual mínimo de sufrágios. Este percentual precisaria ser baixo, para não comprometer o efeito desejado de promoção da representação política dos setores minoritários.

A proposta de Amar objetiva estimular a participação eleitoral e dar às minorias uma representação mais justa. Entretanto, outros problemas, que as propostas mais "ortodoxas" de sorteio pretendem sanar, permanecem intocados. A votação lotérica é, como qualquer outra votação, sensível ao poder do dinheiro. E não há a preocupação de contrabalançar os efeitos dos preconceitos sociais que fazem com que grupos da população sejam sub-representados mesmo sob sistemas de representação proporcional — como, por exemplo, as mulheres.

Além disso, existem candidaturas, o que exclui de antemão da seleção um grande número de pessoas: aquelas que não querem se candidatar. Trata-se de um problema significativo, no âmbito das propostas de loteria. A candidatura voluntária certamente viciaria a representatividade mimética do corpo legislativo. Haveria uma presença excessiva de indivíduos politizados, militantes e ativos; ou, sob um ponto de vista mais negativo, de carreiristas, ambiciosos e oportunistas. Aliás, um dos atrativos da seleção aleatória é reduzir o peso destas pessoas nas esferas de decisão política — como na história de ficção científica The songs of distant Earth, de Arthur C. Clarke, na qual o chefe de Estado era escolhido por sorteio, mas todos os que almejavam o cargo eram previamente desqualificados46 46 Apud Goodwin, op. cit., p. 159. .

A candidatura voluntária também tende a excluir os indivíduos que introjetam sua pretensa incapacidade política e, portanto, julgam-se impossibilitados para qualquer participação mais ativa; em especial, as mulheres e os trabalhadores47 47 Evidência relativa à França é apresentada e discutida em Pierre Bourdieu, La distinction: critique sociale du jugement. Paris: Minuit, 1979, capítulo 8, "Culture et politique" (pp. 463-541). . No entanto, a inclusão obrigatória na loteria poderia produzir uma legião de governantes que, além de inexperientes, seriam desmotivados e desinteressados. Mais ainda, feriria aquilo que Hannah Arendt chamou de "liberdade em relação à política", isto é, o direito de não participar da vida política48 48 Para uma discussão sobre o ponto, ver David Held, Models of Democracy. 2nd edn. Stanford: Stanford University Press, 1996, pp. 325-6. .

DEMOCRACIA DELIBERATIVA

Parte importante das propostas de loteria está ligada a uma corrente da teoria democrática — aquela que, a partir de uma crítica às limitações das "democracias realmente existentes", enfatiza a necessidade de debate público sobre as questões políticas, como forma de gerar deliberações coletivas justas e bem fundadas. Nas palavras de um dos principais divulgadores da corrente, Joshua Cohen, a democracia se realiza quando as decisões políticas são tomadas por aqueles que estarão submetidos a elas, através do "raciocínio público livre entre iguais"49 49 Joshua Cohen, "Democracy and liberty", em Jon Elster (ed.), Deliberative Democracy. Cambridge: Cambridge University Press, 1998, p. 186. . O principal inspirador da corrente é o filósofo alemão Jürgen Habermas, cuja teoria do agir comunicativo apresenta o consenso oriundo da discussão livre e racional como única forma de legitimação das normas sociais.

O viés utópico da obra de Habermas é apontado com freqüência. O padrão comunicativo ideal que ele propõe despreza aspectos relevantes da interação real entre indivíduos nas sociedades humanas. Habermas afirma a igualdade entre os participantes da discussão, mas, na prática, o acesso a ela é determinado pela posse de competências específicas, desigualmente distribuídas. Na situação ideal, a identidade do falante deve ser irrelevante para a consideração que é concedida a seu discurso, ou seja, o reconhecimento social e o acesso a recursos econômicos e políticos não devem pesar, o que também é irrealista. Além disso, os interesses associados à situação do indivíduo na sociedade não devem influenciar suas posições, já que ele deve agir com base numa racionalidade pura. Por fim, a ênfase habermasiana na obtenção do consenso não leva em conta a possibilidade de conflito entre valores divergentes e irredutíveis uns aos outros — o que é, no entanto, uma das características fundantes da modernidade50 50 Outros autores suavizam ou eliminam a busca do consenso. Manin sustenta que o importante não é o acordo unânime, mas a ampla participação na discussão, que legitima a decisão escolhida (Bernard Manin, "On legitimacy and political deliberation". Political Theory, vol. 15, nº 3. Newbury Park, 1987, pp. 338-68). Para Elster, uma solução de compromisso pode servir de alternativa ao consenso (Jon Elster, "Introduction", em id. (ed.), Deliberative Democracy, cit., p. 6). .

Do ponto de vista da busca de modelos que orientem uma prática democrática renovada, são outros, talvez, os principais problemas da teoria de Habermas: seu elevado grau de abstração e o fato de apresentar, sempre, a comunicação face-a-face como modelo. Ou seja, há uma completa desatenção aos problemas de escala existentes nas democracias de massa contemporâneas — e que tornam obrigatórias formas de mediação, seja através da mídia, seja através da representação política. Cohen admite que, diante da objeção de que a noção de deliberação pública é incompatível com as condições políticas atuais, nada tem a responder, pois trata-se de uma objeção incompatível com o "nível de generalidade" da teoria51 51 Joshua Cohen, "Deliberation and democratic legitimacy", em James Bohman e William Rehg (eds.), Deliberative Democracy: Essays on Reason and Politics. Cambridge (MA): The MIT Press, 1997, p. 84. .

As propostas de operacionalização da democracia deliberativa — como as de Barber, Fishkin e Burnheim, que são analisadas abaixo — precisam enfrentar, em primeiro lugar, estes problemas de escala. As duas soluções mais freqüentes, e que muitas vezes aparecem combinadas, são a utilização das novas tecnologias de comunicação, que solucionariam a questão da reunião de milhares ou milhões de pessoas num mesmo espaço físico (mas não resolveriam outro problema crucial, o tempo da discussão), e o sorteio, que reduziria o demos a um número pequeno o suficiente para que se instaurasse a comunicação interpessoal direta. Está sempre presente, ao menos de forma implícita, a crença expressa por Dahl, e citada acima, de que as decisões resultantes da discussão na amostra são idênticas àquelas que o conjunto da população tomaria, caso pudesse deliberar.

O aumento da capacidade deliberativa dos sorteados ocorreria a expensas do restante da população. Não é difícil prever que o método levaria ao declínio ainda maior da discussão política entre os cidadãos comuns, já que suas opiniões de nada valeriam — nem mesmo para decidir o voto em algum candidato. É possível esperar um fosso entre as decisões "esclarecidas" da amostra e a opinião comum. Os ganhos na educação política, portanto, dependeriam por completo do rodízio nas funções de governo.

Entre as tentativas de operacional ização da "democracia deliberativa" abordadas neste artigo, a que concede menor espaço para o sorteio é a de Benjamin Barber, cientista político e ex-assessor do presidente Bill Clinton. Partindo de uma polêmica contra os teóricos conservadores, como Samuel Huntington, que apontavam a "ingovernabilidade das democracias", ele afirma que a crise atual ocorre porque existe pouca (e não excessiva) democracia. Seu projeto é o de gerar uma "democracia forte", com ampla presença popular na política. O primeiro passo seria reformar as premissas sobre a natureza humana e a política, que na democracia liberal são antidemocráticas', egoístas, individualistas e elitistas. Por isso, para a democracia liberal, os valores democráticos são "provisórios, opcionais e condicionais", subordinados a fins privados52 52 Benjamin R. Barber, Strong Democracy: Participatory Politics for a New Age. Berkeley: University of California Press, 1990, p. 4. A primeira edição do livro é de 1984. .

Contra isso, Barber se propõe o desafio de todos os democratas radicais, desde Rousseau e Marx: nutrir a comunidade sem destruir a autonomia individual53 53 Id., p. 114. . Não interessa, aqui, discutir o grau em que sua proposta vence este desafio; apesar de todas as afirmações eloqüentes em contrário, sua "democracia forte" parece ter dificuldade em enfrentar conflitos de interesses e tende para o paroquialismo. Embora o autor classifique-a de "democracia direta"54 54 Id., p. 141. , trata-se de uma proposta de política participatória, sem abolição de mecanismos representativos, inclusive eletivos, e com ênfase na criação de um sentido de comunidade. Para tanto, ele destaca a importância da livre discussão coletiva, com abertura para a compreensão das posições opostas55 55 Id., p. 174. , de uma maneira que ecoa a ação comunicativa de Habermas. A forma-padrão da manifestação política nas democracias liberais, o voto secreto, é condenada por furtar a decisão do eleitor ao debate público56 56 Id., p. 188. . Aqui, Barber remete aos argumentos de Stuart Mill, para quem o voto secreto limitava o papel educativo, fundamental no processo eleitoral, e favorecia a busca egoísta dos interesses privados, em vez do bem comum57 57 Stuart Mill, op. cit., pp. 134-5.

A "democracia forte" seria estabelecida sobre assembléias de vizinhança, com ampla participação direta, e encontros televisionados que as interligariam58 58 Barber, op. cit., pp. 267 e 273. . É fácil perceber que Barber busca um sucedâneo para a esfera pública burguesa do século 18, descrita (e idealizada) por Habermas, na qual os cidadãos discutiam os assuntos públicos nos cafés e os jornais serviam de elo de ligação entre os diversos espaços de debate59 59 Jürgen Habermas, Mudança estrutural da esfera pública. Trad, de Flávio R. Kothe. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1984, capítulo II, "Estruturas sociais da esfera pública" (pp. 42-74). . A partir daí, as decisões seriam tomadas através de um modelo plebiscitario complexo, com múltiplas escolhas que envolveriam a exposição dos motivos, realizados em dois turnos, com seis meses de distância entre si, para que a reflexão sobre a questão pudesse amadurecer60 60 Barber, op. cit., pp. 286-8. . O autor propõe ainda programas de serviço cívico (ou militar) universal, formas de democracia no local de trabalho (embora se esclareça que a propriedade privada não será ameaçada)61 61 Id., p. 305. e medidas de renovação urbanística e arquitetônica, com o objetivo de gerar um espaço comunitário atraente62 62 Id., pp. 305-6. .

Neste modelo, o sorteio cumpre uma função apenas secundária. Barber reconhece as qualidades da seleção aleatória, citando a neutralização do poder do dinheiro, a melhor distribuição das responsabilidades cívicas e o engajamento de um número maior de pessoas nos negócios públicos. Mas restringe sua aplicação a assembléias regionais e agências de poder local que não exijam grande conhecimento especializado63 63 Id., pp. 290-2. . Portanto, a "democracia forte" mostra permanecer sensível à crítica platônica relativa à desigualdade das competências. A loteria, outra vez, é encarada como sendo uma forma de promover educação política, mais do que de alocação efetiva de poder político.

A proposta de James Fishkin é bem menos ambiciosa que a de Barber, mas nela o sorteio ocupa uma posição mais central. Seu objetivo é aprimorar a representação política, fortalecendo os constituintes, sem fazer declinar o desempenho do sistema político. Segundo Fishkin, existe um dilema: ou as decisões são tomadas de forma igualitária, pela massa, que é incompetente, ou de forma competente, pela elite, mas com desigualdade64 64 James S. Fishkin, Democracy and Deliberation: New Directions for Democratic Reform. New Haven: Yale University Press, 1991, pp. 1-2. . A solução seria a instituição da "pesquisa de opinião deliberativa". Enquanto a pesquisa de opinião comum indica aquilo que o povo pensa65 65 Ou nem isso: indica apenas respostas a um questionário. Ver Pierre Bourdieu, "L'opinion publique n'existe pas", em Questions de sociologie. Paris: Minuit, 1984. , a deliberativa indicaria aquilo que o povo pensaria, se pudesse refletir sobre as questões66 66 Fishkin, op. cit., p. 81. .

Seriam sorteados cidadãos que reproduzissem, em seu conjunto, as características demográficas da população. A eles seriam fornecidas as condições materiais para que estudassem e debatessem as diversas questões da agenda política. Assim, diz Fishkin, a pesquisa de opinião deliberativa uniria a igualdade — uma vez que, devido às técnicas de amostragem, todos teriam as mesmas chances de serem escolhidos — ao debate intensivo face-a-face.

No entanto, como o nome já indica, não há a intenção de dotar estes corpos deliberativos de poder: são pesquisas de opinião. A idéia é fazer com que, depois de um período de reflexão e debate, os integrantes da amostra possam discutir os problemas nacionais com os candidatos às indicações à Presidência pelos partidos políticos. Televisionados, os debates com os candidatos poderiam influenciar nos resultados das eleições primárias. Também proporcionariam um meio de contato direto entre a elite dirigente e os cidadãos comuns — um contato efetivo, com troca de idéias e argumentos, ao contrário da ilusão de conexão entre o povo e os líderes, criada pelos meios de comunicação de massa67 67 id., p. 91. .

Fishkin não esconde seu mal-estar com a democracia de massas atual, com sua comunicação direta, unidirecional e demagógica, via mídia, entre governantes e governados. Julga que o modelo atual não permite mais do que uma reflexão superficial sobre os temas da agenda política e promove a incompetência decisória, funcionando como um plebiscito permanente, dada a influência das sondagens de opinião sobre as ações do governo e dos parlamentares68 68 Id., p. 47. . Sua proposta, portanto, visa reduzir o peso da população despreparada sobre nas decisões políticas, gerando uma amostra aleatória que, possuindo tempo e recursos, vai qualificar a si mesma para o debate público.

É uma proposta "realista", exeqüível — o autor critica alternativas mais arrojadas, como a de John Burnheim, por seu utopismo69 69 Id., p. 98. — e, talvez por isso mesmo, com menor impacto transformador. Em janeiro de 1996, foi realizada, nos Estados Unidos, a National Issues Convention, uma "pesquisa de opinião deliberativa" nos moldes preconizados por Fishkin e voltada para as eleições presidenciais daquele ano70 70 Para uma discussão dos aspectos técnicos do evento, ver Daniel M. Merkle, "The National Issues Convention deliberative poll". Public Opinion Quaterly, vol. 60, nº 4. College Park, 1996, pp.588-619. . Ela não obteve nenhuma repercussão perceptível nas eleições primárias ou, adiante, no pleito presidencial.

O realismo de Fishkin contrasta com o radicalismo da transformação proposta pelo australiano John Burnheim. Seu projeto elimina o Estado, as fronteiras nacionais, as administrações centralizadas e os corpos representativos. Em seu lugar, coloca uma intrincada rede de agências especializadas, com integrantes escolhidos por sorteio, que discutiriam questões específicas e teriam diferentes jurisdições territoriais.

Ele começa com a denúncia de que, na prática, não existem regimes democráticos; são, no máximo, "oligarquias eletivas com fortes elementos monárquicos"71 71 John Burnheim, ¡s Democracy Possible? The Alternative to Electoral Politics. Berkeley: University of California Press, 1985, p. 1. . A caracterização não é nova, mas a indicação do culpado é mais original: é o direito de voto. Segundo Burnheim, hoje os indivíduos têm o direito de contribuir para a decisão de questões que não lhes dizem respeito. Isto é, a camponesa elege um deputado que vai deliberar sobre as condições de trabalho nas fábricas; o morador de uma cidade elege um governador que vai construir uma ponte a centenas de quilômetros de distância. Este direito de votar em questões que não interessam ao indivíduo seria a base para a utilização do voto como barganha e, portanto, da degeneração da idéia de vontade popular.

Assim, o primeiro passo seria a eliminação dos poderes políticos tradicionais — legislativos que legislam sobre tudo, executivos com autoridade sobre um determinado território. Em vez disso, Burnheim propõe a criação de inúmeras agências especializadas, que se coordenariam entre si e substituiriam as agências multifuncionais hoje existentes (de nações-Estado a municipalidades). Para cada questão polêmica na sociedade, haveria uma agência, cuja tarefa seria chegar a uma solução para aquele ponto e então encerraria suas atividades. Torna-se claro que as fronteiras fixas de nações, estados ou municípios também desapareceriam, pois um problema poderia interessar a parte do Brasil, outro ao Brasil todo e parte da Argentina, outro a partes de Brasil e Argentina etc. O modelo é batizado de "demarquia".

As agências teriam seus integrantes sorteados, mas sorteados apenas entre aquelas pessoas que tivessem interesse objetivo e direto na questão. Assim, Burnheim nos incita a substituir o "ilusório controle" do eleitor sobre o representante, bem como a agregação cega de votos irrefletidos, em eleições e referendo, pela igualdade de chances de ser selecionado como participante ativo na tomada de decisões sobre os problemas realmente relevantes do ponto de vista individual72 72 Id., p. 9. . É de se notar que, contra a visão liberal clássica da representação, Burnheim diz que são representados os interesses, não os indivíduos, o que justifica a exclusão dos "desinteressados". De forma curiosa, ele combina esta ênfase no interesse, único salvo-conduto que torna legítima a participação na tomada de decisões, com a valorização do debate racional, própria do ideal democrático-deliberativo, que em sua fonte — a obra de Habermas — está associado justamente à idéia de discussão desinteressada.

A escolha por loteria é uma necessidade da demarquia', já que a existência de múltiplas agências decisorias geraria um excesso de eleitorados diferentes e de votações. O resultado seria que os eleitores estariam ainda mais desmotivados e desinformados sobre as opções em jogo73 73 Id., p. 110. . O sorteio proposto, porém, é complexo. O primeiro passo seria a realização de uma sondagem (amostrai) sobre cada questão relevante, para saber como se distribuem as opiniões dentro da população. A partir daí, excluem-se os que se dizem desinteressados da questão. Quanto aos outros, verifica-se quais são as proporções entre as diferentes opiniões e sorteia-se um grupo que respeite esta proporcionalidade. A amostra vai estudar o assunto, debater entre si, negociar concessões mútuas e tomar decisões.

Burnheim está consciente dos problemas das pesquisas de opinião, que colhem respostas impensadas e, portanto, pouco representativas. Mas, no caso, estes problemas não teriam grande impacto, já que a pesquisa seria apenas um "exercício exploratório"; depois, os verdadeiros tomadores de decisão poderiam pensar à vontade — e, o que é mais importante, pensar coletivamente74 74 Id., pp. 111-2. . Estes argumentos, por si só, já afirmariam a superioridade da demarquia sobre a idéia de democracia plebiscitária. Na verdade, todo o argumento platônico é voltado, por Burnheim, contra as democracias atualmente existentes e em defesa de sua proposta.

Em contraste com a prática democrática existente, a demarquia não assume que a maioria da população está em posição de fazer avaliações com base razoável sobre todas os principais temas de governo ou mesmo de calcular os méritos de elites rivais competindo por votos. O que ela assume é que a maior parte das pessoas, se confrontadas com questões concretas limitadas sobre assuntos que as afetam diretamente, são capazes de alcançar uma compreensão suficiente, sobre os temas, para fazer escolhas sensatas75 75 Id., p. 16. .

Na medida do possível, os representantes sorteados devem ser voluntários, sinal de que vão se dedicar à questão e de que têm, de fato, interesse nela. Assim, uma etapa intermediária do processo é alistar os candidatos, para depois proceder ao sorteio. Cada voluntário teria que declarar qual opinião está defendendo (a princípio, já que as posições podem e devem mudar com a discussão). Para evitar má-fé, Burnheim observa que eles devem ser judicialmente responsabilizados, caso não ajam de acordo com o que diziam defender76 76 Id., p. 111. . Com isso, ressurge — apesar de seus protestos em contrário — a idéia de accountability: quem iria denunciar o mau representante, senão alguém que se coloca na posição de constituinte? E o Estado, que deveria ter acabado, reencarna na figura de um judiciário poderoso, que controla a atuação dos integrantes das diferentes agências especializadas e compatibiliza suas decisões, que podem ser contraditórias.

Burnheim se mostra mais atento aos problemas que sua proposta de transformação radical da sociedade (em especial, o sorteio) apresenta. Justamente por isso, seu modelo é intrincado, combinando diversos procedimentos para neutralizar os inconvenientes que trariam caso estivessem isolados: sondagens de opinião de caráter plebiscitário, sorteio, voluntariado, órgãos de controle e arbitração, deliberação coletiva. O resultado parece pouco funcional, sobretudo na ausência, como deseja o autor, de um aparato burocrático.

A BUSCA DE ALTERNATIVAS

As propostas de reintrodução do sorteio são encaradas, em geral, como irrealistas e utópicas, quando não bizarras e insensatas. Num movimento notável, a eleição, que da Antigüidade até o século 18 era a marca da aristocracia, hoje é quase um sinônimo de democracia. Eliminar ou reduzir o papel dos mecanismos eleitorais, portanto, feriria de morte as instituições democráticas. Este artigo procurou mostrar que os projetos de loteria, por extravagantes que sejam em relação às práticas políticas atuais, merecem atenção. Einstein escreveu, certa vez, que "se, à primeira vista, a idéia não é absurda, então não há esperança para ela". As idéias absurdas de seleção aleatória de governantes nos ajudam a ver melhor as limitações e os problemas das democracias eletivas, e até a procurar por soluções.

Isto não quer dizer que as alternativas propostas sejam viáveis ou convenientes. Na verdade, sua fragilidade é patente. O sorteio que funcionava na democracia grega era uma instituição entre outras, com as quais se combinava. Em Atenas, o sorteio gerava um efetivo rodízio nos cargos públicos, com a participação de virtualmente todos os cidadãos. Estima-se que um em cada dois cidadãos teria participado da boulé – a magistratura decisiva, pois fixava a agenda da assembléia popular – pelo menos uma vez na vida77 77 Manin, The Principles of Representative Government, cit., p. 30. . Num país como o Brasil, seria diferente. Considerando o eleitorado de 1998 (com mais de 106 milhões de eleitores), uma expectativa de vida de 70 anos e mantendo o número de cadeiras e os mandatos da Câmara dos Deputados e do Senado, o brasileiro teria uma chance em 14745 de ocupar, por uma vez, uma cadeira no Congresso. A possibilidade de alcançar uma das 1405 vagas nas assembléias estaduais também seria pequena, inferior a 0,02% — ou seja, a esmagadora maioria da população estaria excluída do rodízio no poder ou, então, fadada à política paroquial.

Mais importante ainda, a democracia grega era uma democracia direta. Este fato possui pelo menos três implicações relevantes para a presente discussão. Em primeiro lugar, a assembléia popular era, muito mais do que a participação eventual nos cargos públicos, o local da educação política78 78 M. I. Finley, Politics in the Ancient World. Cambridge: Cambridge University Press, 1991, pp. 28-9. . Em segundo lugar, o contato direto e imediato entre magistrados e cidadãos comuns ampliava a capacidade de controle por parte dos últimos79 79 M. I. Finley, Democracia antiga e moderna. Trad, de Waldéa Barcellos e Sandra Bedran. Rio de Janeiro: Graal, 1988, pp. 30-1. . Fossem sorteados ou eleitos (como os chefes militares), os magistrados precisavam prestar contas à assembléia popular e estavam submetidos a seu voto de desconfiança. Não faltava, assim, uma forma de accountability ao modelo ateniense.

A rigor, o poder político permanecia nas mãos da assembléia, com os magistrados, eleitos ou sorteados, cumprindo funções administrativas80 80 Manin, The Principles of Representative Government, cit., p. 15. . O contrário do que ocorre hoje, quando praticamente todas as propostas de loteria, dos tímidos órgãos consultivos de Dahl ao projeto mais radical de Callenbach e Phillips, deixam de fora o poder executivo. Há, aqui, tanto a permanência da desconfiança sobre a igualdade de competências81 81 Barbara Goodwin observa que qualquer limitação no alcance dos sorteios indica a permanência de dúvidas quanto ao argumento democrático da igualdade e a aceitação de valores elitistas (Goodwin, op. cit., p. 160). quanto uma consciência mais clara a respeito da diversidade dos interesses existentes na sociedade, que pode ser refletida num corpo colegiado, mas não num cargo individual. Cabe lembrar que o direito de cidadania, na Grécia, era restrito, dele ficando excluídos escravos, metecos e mulheres. Embora pudessem ocorrer importantes conflitos de interesse entre os cidadãos, como de fato acontecia, eles formavam um grupo relativamente uniforme, ao menos diante da maioria da população, excluída da esfera publica.

Por fim, o fato de que a assembléia popular retinha o poder político permitia, no modelo grego, o exercício da liderança política82 82 Finley, Democracia antiga e moderna, cit., capítulo 1, "Líderes e liderados", pp. 17-53. . Todos possuíam direito igual à fala na assembléia (o princípio da isegoria, crucial para a democracia grega), mas uma minoria efetivamente o utilizava. Os oradores cumpriam a função de liderança, garantindo a continuidade política e o acúmulo de experiência. Mas não formavam uma elite dirigente, pois o poder decisorio permanecia com o conjunto dos cidadãos.

Fora deste arcabouço institucional e social, o sorteio perde muito de seu sentido. Avultam os riscos que ele carrega: queda de continuidade e de responsividade, aumento do poder das burocracias, como reconhecem mesmo seus defensores mais ardorosos83 83 Goodwin, op. cit., pp. 158-9. . Mas as propostas de utilização das loterias são úteis por destacar muitas das mazelas das "democracias realmente existentes". De fato, os mecanismos de responsividade dos representantes perante seus constituintes são insatisfatórios. De fato, as decisões políticas são monopolizadas por uma pequena elite, cujo perfil costuma ser muito distinto do restante da população. De fato, o processo eleitoral é viciado pela influência excessiva do poder econômico. De fato, a base primeira de legitimação do regime — o sentimento do cidadão de estar sendo representado — está corroída. E, de fato, as democracias eleitorais são construídas sobre a negação da premissa democrática da igualdade entre todos.

Alguns dos autores aqui discutidos apenas propõem que o sorteio complemente ou substitua parcialmente a eleição como forma de escolha de representantes; é o caso de Dahl, Callenbach e Phillips, Amar e Fishkin. Outros o integram num projeto de reforma mais amplo, como Barber e Burnheim; Goodwin sugere sua adoção em muitas outras esferas além da política. Em todos os casos, a loteria é apresentada como uma maneira vigorosa e econômica de afirmar a igualdade entre os cidadãos, de promover a rotação na ocupação dos cargos públicos, de dar voz às pessoas comuns, de equilibrar a presença dos diferentes grupos sociais nas esferas de poder e de reduzir a influência política do dinheiro.

Outras medidas poderiam resolver ou minorar cada um destes problemas. Quotas de representação podem melhorar a participação de grupos politicamente minoritários. Restrições à reeleição, inclusive para o legislativo, contribuiriam para impedir a formação de estratos oligárquicos. Uma legislação severa de financiamento público de campanhas obstaculizaría a ação do poder econômico. Apenas o sorteio, porém, parece capaz de prover soluções a todos estes aspectos, simultaneamente. Ele seria o método ideal para promover a redistribuição do capital político, isto é, da capacidade da tomada de decisões públicas — e a concentração deste capital está na raiz da crise das democracias representativas.

No entanto, a ausência de compromisso do sorteado em relação àqueles que deveria "representar" torna a alternativa pouco atraente. Em escala local, onde há a possibilidade de controle direto por parte da população, a seleção aleatória talvez possa alcançar resultados interessantes. Para além disso, significa abrir mão do fiapo de soberania popular que os regimes competitivos ainda conservam. Mesmo diante dos benefícios que a seleção lotérica possa trazer, parece um preço alto demais para ser pago.

O drama da política contemporânea é que há, ao mesmo tempo, uma crise da representação e a impossibilidade de retorno a formas de democracia direta. Para sociedades tão extensas, populosas, complexas e plurais como as de hoje, o sorteio de governantes e legisladores também não parece ser a saída. Mas, ao menos, as propostas para sua adoção sinalizam com clareza os principais defeitos da organização representativa atual, assinalando, com correção, a desconcentração do capital político como o desafio fundamental a ser superado. Frágeis como sejam, elas são tentativas de repensar a organização da democracia, em vez de optarem pela solução — mais fácil e palatável — de promover a acomodação.

  • 1 Nas eleiçőes presidenciais de 1996, nos Estados Unidos, menos da metade dos cidadăos em idade de votar compareceram ŕs urnas, o que parece indicar que se desceu mais um patamar numa tendęncia iniciada na década de 1960 (dados do site "Dave Leip's atlas of U.S. presidential elections", no endereço http:// uselectionsatlas.org). Para dados sobre outros países desenvolvidos, ver Manuel Castells. O poder da identidade. Trad, de Klauss Brandini Gerhardt. Săo Paulo. Paz e Terra, 1999, pp. 401-8.
  • 2 Embora sejam, por vezes, encarados como uma "verdade" já pronta, os resultados de tais pesquisas precisam ser interpretados com cuidado. De qualquer forma, săo um indício eloqüente do alheamento político. No caso brasileiro, para a manifestaçăo do sentimento de que os políticos năo representam os interesses de seus eleitores, ver os dados em José Álvaro Moisés, Os brasileiros e a democracia. S. Paulo: Ática, 1995, p. 207.
  • Para dados referentes aos Estados Unidos, ver David B. Magleby e Kelly D. Patterson, "Congressional reform". Public Opinion Quaterly. vol. 58, nş 3. Chicago, 1994, pp. 419-27 (ver tabelas ŕs pp. 423-4).
  • 3 Anne Phillips, The Politics of Presence. Oxford: Oxford University Press, 1995.
  • 4 Para uma discussăo sobre este ponto, ver Anne Phillips, Democracy and Difference. University Park: The Pennsylvania State University Press, 1993, p. 100.
  • 5 Montesquieu, De I'esprit des lois, livro II, capítulo II; cito de CEuvres complčtes, t. II. Paris: Gallimard, 1951, p. 242.
  • 6 Jean-Jacques Rousseau, Du contraí social, livro III, capítulo V; cito de (Euvres completes, t. III. Paris: Gallimard, 1964, pp. 406-7.
  • 7 Fustel de Coulanges, A cidade antiga. Trad, de Fernando de Aguiar. 4Ş ed. S. Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 198.
  • 8 Bernard Manin, The Principles of Representative Government. Cambridge: Cambridge University Press, 1997, pp. 26-7.
  • 9 Platăo, A República, 488a-e; cito da traduçăo de Carlos Alberto Nunes. Belém: UFPA, 1988, pp. 248-9.
  • 11 Ver, sobre a questăo, o livro seminal de Bernard Manin, citado. É possível dizer que a representaçăo proporcional, que encontraria importantes advogados a partir do século 19, em especial Stuart Mill (e, no Brasil, José de Alencar), é "descritiva", na medida em que se propőe ser urna amostra, razoavelmente exata, da divisăo das opiniőes no seio do eleitorado. No entanto, permanece a indiferença quanto ŕ similaridade de composiçăo social entre o corpo de representantes e seus constituintes. Aliás, o próprio Stuart Mill propunha a adoçăo de artifícios que garantissem a super-representaçăo das minorias instruídas (cf. John Stuart Mill, Consideraçőes sobre o governo representativo. Trad, de E. Jacy Monteiro. 3Ş ed. S. Paulo: Ibrasa, 1995, pp. 116-21).
  • 12 O conceito remete a Hanna Fenichel Pitkin, The Concept of Representation. Berkley: University of California Press, 1967; ver o capítulo 4, "Standing for: descriptive representation" (pp. 60-91).
  • 13 Alexander Hamilton, James Madison e John Jay, The Federalist. Chicago: Encyclopaedia Britannica, 1990, p. 113.
  • 15 Ellen Meiksins Wood, Democracy against Capitalism: Renewing Historical Materialism. Cambridge: Cambridge University Press, 1995, p. 216.
  • 16 John Stuart Mill, Consideraçőes sobre o governo representativo. Trad, de E. Jacy Monteiro. 3Ş ed. S. Paulo: Ibrasa, 1995, p. 115.
  • 18 José Frederico Marques, A instituiçăo do júri, vol. 1. S. Paulo: Saraiva, 1963, p. 5.
  • 19Apud Alcides de Mendonça Lima, "Júri: instituiçăo nociva e arcaica". Revista Forense, nş 196. Rio de Janeiro, 1961, pp. 16-24 (citaçăo ŕ p. 19).
  • 20 Sobre a questăo, ver Barbara Goodwin, Justice by Lottery. Chicago: The University of Chicago Press, 1992, pp. 163-7;
  • Akhil Reed Amar, "Chosing representatives by lottery voting". The Yale Law Journal, vol. 93, nş 7. New Haven, 1984, pp. 1287-8;
  • Jon Elster, Salomonic Judgements. Cambridge: Cambridge University Press, 1989, pp. 93-103.
  • 25 Mordecai Roshwald, Plano sete. Trad, de Alfredo Margando. Lisboa: Livros do Brasil, s.d. A ediçăo original é de 1959.
  • 26 Deixo de levar em conta, aqui, a distinçăo que paite da literatura especializada faz entre accountability e responsividade (responsiveness); ver Adam Przeworski, Susan C. Stokes e Bernard Manin, "Introduction", em id. (eds.), Democracy, Accountability, and Representation. Cambridge: Cambridge University Press, 1999, pp. 9-10.
  • 27 Pelo menos desde os anos 1940, com os trabalhos de Schumpeter e Lazarsfeld, há o reconhecimento da indiferença, "típica" do eleitor comum. A interpretaçăo dada ao fato varia: é um efeito da "natureza humana", um componente necessário ŕ estabilidade do sistema político (que, de outra forma, seria excessivamente tensionado) ou, numa leitura mais crítica, a conseqüęncia de certos vieses estruturais deste mesmo sistema. Para dua diferentes abordagens desta última corrente, ver Pierre Bourdieu, La distinction. Paris: Minuit, 1979, cap. 8: "Cultures et politique",
  • e Claus Offe, "Dominaçăo de classe e sistema político: sobre a seletividade das instituiçőes políticas", em Problemas estruturais do Estado capitalista. Trad, de Barbara Freitag. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1984.
  • 28 Robert Michels, Sociologia dos partidos políticos. Trad, de Arthur Chaudon. Brasília: Editora UnB, 1982, sobretudo a sexta parte (pp. 215-43).
  • 30 A proposta é do ex-vice-presidente Walter Mondale. Apud James S. Fishkin, Democracy and Deliberation: New Directions for Democratic Reforms. New Haven: Yale University Press, 1991, p. 10.
  • 33 Ernest Callenbach e Michael Phillips, A Citizen Legislature. Berkeley: Banyan Tree, 1985.
  • 34 Eleni Varikas, "Refundar ou reacomodar a democracia? Reflexőes críticas acerca da paridade entre os sexos". Estudos Feministas, vol. 4, nş 1. Rio de Janeiro. 1996, pp. 65-94; ver pp. 79-81.
  • 35 Robert A. Dahl, Democracy and its Critics. New Haven: Yale University Press, 1989, p. 340.
  • 36 Robert A. Dahl, After the Revolution? Authority in a Good Society. Revised edition. New Haven: Yale University Press, 1990, pp. 122-3.
  • 38 Dahl, After the revolution?, cit., pp. 122-5. Cabe observar que, fora pequenas correçőes de forma, Dahl optou por manter inalterada a seçăo sobre sorteio na ediçăo revisada de seu livro. Cf. a versăo original: Robert A. Dahl, After the Revolution? Authority in a Good Society. New Haven: Yale University Press, 1970, pp. 149-53.
  • 42 Mancur Olson, The logic of Collective Action: Public Goods and the Theory of Groups. Cambridge (MA): Harvard University Press, 1965.
  • 43 A rigor, o "voto cumulativo" é um sistema eleitoral majoritário, de voto múltiplo, utilizado por mais de um século no Estado de Illinois (ver José Antônio Giusti Tavares, Sistemas eleitorais nas democracias contemporâneas. Rio de Janeiro: Relume-Damará, 1994, p. 91).
  • 47 Evidęncia relativa ŕ França é apresentada e discutida em Pierre Bourdieu, La distinction: critique sociale du jugement. Paris: Minuit, 1979, capítulo 8, "Culture et politique" (pp. 463-541).
  • 48 Para uma discussăo sobre o ponto, ver David Held, Models of Democracy. 2nd edn. Stanford: Stanford University Press, 1996, pp. 325-6.
  • 49 Joshua Cohen, "Democracy and liberty", em Jon Elster (ed.), Deliberative Democracy. Cambridge: Cambridge University Press, 1998, p. 186.
  • 50 Outros autores suavizam ou eliminam a busca do consenso. Manin sustenta que o importante năo é o acordo unânime, mas a ampla participaçăo na discussăo, que legitima a decisăo escolhida (Bernard Manin, "On legitimacy and political deliberation". Political Theory, vol. 15, nş 3. Newbury Park, 1987, pp. 338-68).
  • 51 Joshua Cohen, "Deliberation and democratic legitimacy", em James Bohman e William Rehg (eds.), Deliberative Democracy: Essays on Reason and Politics. Cambridge (MA): The MIT Press, 1997, p. 84.
  • 52 Benjamin R. Barber, Strong Democracy: Participatory Politics for a New Age. Berkeley: University of California Press, 1990, p. 4.
  • 59 Jürgen Habermas, Mudança estrutural da esfera pública. Trad, de Flávio R. Kothe. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1984, capítulo II, "Estruturas sociais da esfera pública" (pp. 42-74).
  • 64 James S. Fishkin, Democracy and Deliberation: New Directions for Democratic Reform. New Haven: Yale University Press, 1991, pp. 1-2.
  • 65 Ou nem isso: indica apenas respostas a um questionário. Ver Pierre Bourdieu, "L'opinion publique n'existe pas", em Questions de sociologie. Paris: Minuit, 1984.
  • 70 Para uma discussăo dos aspectos técnicos do evento, ver Daniel M. Merkle, "The National Issues Convention deliberative poll". Public Opinion Quaterly, vol. 60, nş 4. College Park, 1996, pp.588-619.
  • 71 John Burnheim, Ąs Democracy Possible? The Alternative to Electoral Politics. Berkeley: University of California Press, 1985, p. 1.
  • 78 M. I. Finley, Politics in the Ancient World. Cambridge: Cambridge University Press, 1991, pp. 28-9.
  • 79 M. I. Finley, Democracia antiga e moderna. Trad, de Waldéa Barcellos e Sandra Bedran. Rio de Janeiro: Graal, 1988, pp. 30-1.
  • *
    Este artigo se beneficiou da leitura atenta e das observações acuradas do parecerista anônimo de
    Lua Nova, a quem agradeço. Também sou reconhecido a Regina Dalcastagnè, pelos comentários sobre todo o texto, e a Claudia Peixoto e Liliane Lustosa Pierre, pelas referências sobre o funcionamento dos tribunais de júri. As falhas e omissões permanecem sendo de minha inteira responsabilidade.
  • 1
    Nas eleições presidenciais de 1996, nos Estados Unidos, menos da metade dos cidadãos em idade de votar compareceram às urnas, o que parece indicar que se desceu mais um patamar numa tendência iniciada na década de 1960 (dados do
    site "Dave Leip's atlas of U.S. presidential elections", no endereço
    http:// uselectionsatlas.org). Para dados sobre outros países desenvolvidos, ver Manuel Castells.
    O poder da identidade. Trad, de Klauss Brandini Gerhardt. São Paulo. Paz e Terra, 1999, pp. 401-8. No Brasil, mesmo com a obrigatoriedade do voto, a abstenção no primeiro turno das eleições gerais de 1998 alcançou 21,49%; somando-se a ela os votos brancos e nulos, 36,17% dos eleitores registrados declinaram do direito de escolher o presidente da República.
  • 2
    Embora sejam, por vezes, encarados como uma "verdade" já pronta, os resultados de tais pesquisas precisam ser interpretados com cuidado. De qualquer forma, são um indício eloqüente do alheamento político. No caso brasileiro, para a manifestação do sentimento de que os políticos não representam os interesses de seus eleitores, ver os dados em José Álvaro Moisés,
    Os brasileiros e a democracia. S. Paulo: Ática, 1995, p. 207. Para dados referentes aos Estados Unidos, ver David B. Magleby e Kelly D. Patterson, "Congressional reform".
    Public Opinion Quaterly. vol. 58, nº 3. Chicago, 1994, pp. 419-27 (ver tabelas às pp. 423-4).
  • 3
    Anne Phillips,
    The Politics of Presence. Oxford: Oxford University Press, 1995.
  • 4
    Para uma discussão sobre este ponto, ver Anne Phillips,
    Democracy and Difference. University Park: The Pennsylvania State University Press, 1993, p. 100.
  • 5
    Montesquieu,
    De I'esprit des lois, livro II, capítulo II; cito de
    CEuvres complètes, t. II. Paris: Gallimard, 1951, p. 242.
  • 6
    Jean-Jacques Rousseau,
    Du contraí social, livro III, capítulo V; cito de
    (Euvres completes, t. III. Paris: Gallimard, 1964, pp. 406-7. O Estado proposto por Rousseau é uma democracia direta porque reside no povo, sem intermediários ou representantes, o poder de fazer as leis; para ele, o governo é apenas um órgão executivo.
  • 7
    Fustel de Coulanges,
    A cidade antiga. Trad, de Fernando de Aguiar. 4ª ed. S. Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 198.
  • 8
    Bernard Manin,
    The Principles of Representative Government. Cambridge: Cambridge University Press, 1997, pp. 26-7.
  • 9
    Platão,
    A República, 488a-e; cito da tradução de Carlos Alberto Nunes. Belém: UFPA, 1988, pp. 248-9. O mesmo tipo de argumento aparece em outro diálogo platônico, o
    Protagoras.
  • 10
    Manin, op. cit.; ver, em especial, o capítulo 3, "The principle of distinction" (pp. 94-131).
  • 11
    Ver, sobre a questão, o livro seminal de Bernard Manin, citado. É possível dizer que a representação proporcional, que encontraria importantes advogados a partir do século 19, em especial Stuart Mill (e, no Brasil, José de Alencar), é "descritiva", na medida em que se propõe ser urna amostra, razoavelmente exata, da divisão das
    opiniões no seio do eleitorado. No entanto, permanece a indiferença quanto à similaridade de composição social entre o corpo de representantes e seus constituintes. Aliás, o próprio Stuart Mill propunha a adoção de artifícios que garantissem a super-representação das minorias instruídas (cf. John Stuart Mill,
    Considerações sobre o governo representativo. Trad, de E. Jacy Monteiro. 3ª ed. S. Paulo: Ibrasa, 1995, pp. 116-21).
  • 12
    O conceito remete a Hanna Fenichel Pitkin,
    The Concept of Representation. Berkley: University of California Press, 1967; ver o capítulo 4, "Standing for: descriptive representation" (pp. 60-91).
  • 13
    Alexander Hamilton, James Madison e John Jay,
    The Federalist. Chicago: Encyclopaedia Britannica, 1990, p. 113.
  • 14
    id., pp. 176-7. O texto é atribuido a Hamilton ou Madison.
  • 15
    Ellen Meiksins Wood,
    Democracy against Capitalism: Renewing Historical Materialism. Cambridge: Cambridge University Press, 1995, p. 216.
  • 16
    John Stuart Mill,
    Considerações sobre o governo representativo. Trad, de E. Jacy Monteiro. 3ª ed. S. Paulo: Ibrasa, 1995, p. 115.
  • 17
    Montesquieu, op. cit., livro XI, capítulo VI (p. 399 da edição indicada).
  • 18
    José Frederico Marques,
    A instituição do júri, vol. 1. S. Paulo: Saraiva, 1963, p. 5.
  • 19
    Apud Alcides de Mendonça Lima, "Júri: instituição nociva e arcaica".
    Revista Forense, nº 196. Rio de Janeiro, 1961, pp. 16-24 (citação à p. 19).
  • 20
    Sobre a questão, ver Barbara Goodwin,
    Justice by Lottery. Chicago: The University of Chicago Press, 1992, pp. 163-7; Akhil Reed Amar, "Chosing representatives by lottery voting".
    The Yale Law Journal, vol. 93, nº 7. New Haven, 1984, pp. 1287-8; Jon Elster,
    Salomonic Judgements. Cambridge: Cambridge University Press, 1989, pp. 93-103.
  • 21
    Marques, op. cit., p. 91.
  • 22
    Goodwin, op. cit., p. 164.
  • 23
    Elster, op. cit., p. 73.
  • 24
    Em termos, já que outros 200 mil lugares haviam sido destinados, de antemão, para as elites políticas, militares, científicas e intelectuais. E só eram qualificados para o sorteio os menores de 50 anos, em função da necessidade de repovoar o planeta após a colisão.
  • 25
    Mordecai Roshwald,
    Plano sete. Trad, de Alfredo Margando. Lisboa: Livros do Brasil, s.d. A edição original é de 1959.
  • 26
    Deixo de levar em conta, aqui, a distinção que paite da literatura especializada faz entre
    accountability e responsividade
    (responsiveness); ver Adam Przeworski, Susan C. Stokes e Bernard Manin, "Introduction", em id. (eds.),
    Democracy, Accountability, and Representation. Cambridge: Cambridge University Press, 1999, pp. 9-10.
  • 27
    Pelo menos desde os anos 1940, com os trabalhos de Schumpeter e Lazarsfeld, há o reconhecimento da indiferença, "típica" do eleitor comum. A interpretação dada ao fato varia: é um efeito da "natureza humana", um componente necessário à estabilidade do sistema político (que, de outra forma, seria excessivamente tensionado) ou, numa leitura mais crítica, a conseqüência de certos vieses estruturais deste mesmo sistema. Para dua diferentes abordagens desta última corrente, ver Pierre Bourdieu,
    La distinction. Paris: Minuit, 1979, cap. 8: "Cultures et politique", e Claus Offe, "Dominação de classe e sistema político: sobre a seletividade das instituições políticas", em
    Problemas estruturais do Estado capitalista. Trad, de Barbara Freitag. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1984.
  • 28
    Robert Michels,
    Sociologia dos partidos políticos. Trad, de Arthur Chaudon. Brasília: Editora UnB, 1982, sobretudo a sexta parte (pp. 215-43).
  • 29
    Entre os elementos aleatórios presentes no processo eleitoral brasileiro, por exemplo, estão a determinação do número de identificação dos partidos e, dentro destes, dos candidatos às eleições proporcionais; a ordem de aparição dos partidos e coligações na propaganda eleitoral no rádio e na TV; e (onde não há urna eletrônica) o ordenamento dos nomes na cédula de votação.
  • 30
    A proposta é do ex-vice-presidente Walter Mondale.
    Apud James S. Fishkin,
    Democracy and Deliberation: New Directions for Democratic Reforms. New Haven: Yale University Press, 1991, p. 10.
  • 31
    A. Lindbeck,
    apud Jon Elster, op. cit., p. 91.
  • 32
    Goodwin, op. cit., p. 178.
  • 33
    Ernest Callenbach e Michael Phillips,
    A Citizen Legislature. Berkeley: Banyan Tree, 1985.
  • 34
    Eleni Varikas, "Refundar ou reacomodar a democracia? Reflexões críticas acerca da paridade entre os sexos".
    Estudos Feministas, vol. 4, nº 1. Rio de Janeiro. 1996, pp. 65-94; ver pp. 79-81.
  • 35
    Robert A. Dahl,
    Democracy and its Critics. New Haven: Yale University Press, 1989, p. 340.
  • 36
    Robert A. Dahl,
    After the Revolution? Authority in a Good Society. Revised edition. New Haven: Yale University Press, 1990, pp. 122-3.
  • 37
    Dahl,
    Democracy and its critics, cit., p. 340.
  • 38
    Dahl,
    After the revolution?, cit., pp. 122-5. Cabe observar que, fora pequenas correções de forma, Dahl optou por manter inalterada a seção sobre sorteio na edição revisada de seu livro. Cf. a versão original: Robert A. Dahl,
    After the Revolution? Authority in a Good Society. New Haven: Yale University Press, 1970, pp. 149-53.
  • 39
    Amar, op. cit., pp. 1283-308.
  • 40
    Ver A. Phillips,
    The politics of presence, cit., capítulo 4, "Race-conscious districting in the USA" (pp. 85-114).
  • 41
    Amar, op. cit., p. 1299.
  • 42
    Mancur Olson,
    The logic of Collective Action: Public Goods and the Theory of Groups. Cambridge (MA): Harvard University Press, 1965.
  • 43
    A rigor, o "voto cumulativo" é um sistema eleitoral majoritário, de voto múltiplo, utilizado por mais de um século no Estado de Illinois (ver José Antônio Giusti Tavares,
    Sistemas eleitorais nas democracias contemporâneas. Rio de Janeiro: Relume-Damará, 1994, p. 91). Amar, no entanto, usa a expressão em sentido diferente, para se referir à representação proporcional tradicional.
  • 44
    Amar, op. cit., p. 1301.
  • 45
    Id., p. 1303.
  • 46
    Apud Goodwin, op. cit., p. 159.
  • 47
    Evidência relativa à França é apresentada e discutida em Pierre Bourdieu,
    La distinction: critique sociale du jugement. Paris: Minuit, 1979, capítulo 8, "Culture et politique" (pp. 463-541).
  • 48
    Para uma discussão sobre o ponto, ver David Held,
    Models of Democracy. 2nd edn. Stanford: Stanford University Press, 1996, pp. 325-6.
  • 49
    Joshua Cohen, "Democracy and liberty", em Jon Elster (ed.),
    Deliberative Democracy. Cambridge: Cambridge University Press, 1998, p. 186.
  • 50
    Outros autores suavizam ou eliminam a busca do consenso. Manin sustenta que o importante não é o acordo unânime, mas a ampla participação na discussão, que legitima a decisão escolhida (Bernard Manin, "On legitimacy and political deliberation".
    Political Theory, vol. 15, nº 3. Newbury Park, 1987, pp. 338-68). Para Elster, uma solução de compromisso pode servir de alternativa ao consenso (Jon Elster, "Introduction", em id. (ed.),
    Deliberative Democracy, cit., p. 6).
  • 51
    Joshua Cohen, "Deliberation and democratic legitimacy", em James Bohman e William Rehg (eds.),
    Deliberative Democracy: Essays on Reason and Politics. Cambridge (MA): The MIT Press, 1997, p. 84.
  • 52
    Benjamin R. Barber,
    Strong Democracy: Participatory Politics for a New Age. Berkeley: University of California Press, 1990, p. 4. A primeira edição do livro é de 1984.
  • 53
    Id., p. 114.
  • 54
    Id., p. 141.
  • 55
    Id., p. 174.
  • 56
    Id., p. 188.
  • 57
    Stuart Mill, op. cit., pp. 134-5.
  • 58
    Barber, op. cit., pp. 267 e 273.
  • 59
    Jürgen Habermas,
    Mudança estrutural da esfera pública. Trad, de Flávio R. Kothe. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1984, capítulo II, "Estruturas sociais da esfera pública" (pp. 42-74).
  • 60
    Barber, op. cit., pp. 286-8.
  • 61
    Id., p. 305.
  • 62
    Id., pp. 305-6.
  • 63
    Id., pp. 290-2.
  • 64
    James S. Fishkin,
    Democracy and Deliberation: New Directions for Democratic Reform. New Haven: Yale University Press, 1991, pp. 1-2.
  • 65
    Ou nem isso: indica apenas respostas a um questionário. Ver Pierre Bourdieu, "L'opinion publique n'existe pas", em
    Questions de sociologie. Paris: Minuit, 1984.
  • 66
    Fishkin, op. cit., p. 81.
  • 67
    id., p. 91.
  • 68
    Id., p. 47.
  • 69
    Id., p. 98.
  • 70
    Para uma discussão dos aspectos técnicos do evento, ver Daniel M. Merkle, "The National Issues Convention deliberative poll".
    Public Opinion Quaterly, vol. 60, nº 4. College Park, 1996, pp.588-619.
  • 71
    John Burnheim,
    ¡s Democracy Possible? The Alternative to Electoral Politics. Berkeley: University of California Press, 1985, p. 1.
  • 72
    Id., p. 9.
  • 73
    Id., p. 110.
  • 74
    Id., pp. 111-2.
  • 75
    Id., p. 16.
  • 76
    Id., p. 111.
  • 77
    Manin,
    The Principles of Representative Government, cit., p. 30.
  • 78
    M. I. Finley,
    Politics in the Ancient World. Cambridge: Cambridge University Press, 1991, pp. 28-9.
  • 79
    M. I. Finley,
    Democracia antiga e moderna. Trad, de Waldéa Barcellos e Sandra Bedran. Rio de Janeiro: Graal, 1988, pp. 30-1.
  • 80
    Manin,
    The Principles of Representative Government, cit., p. 15.
  • 81
    Barbara Goodwin observa que qualquer limitação no alcance dos sorteios indica a permanência de dúvidas quanto ao argumento democrático da igualdade e a aceitação de valores elitistas (Goodwin, op. cit., p. 160).
  • 82
    Finley,
    Democracia antiga e moderna, cit., capítulo 1, "Líderes e liderados", pp. 17-53.
  • 83
    Goodwin, op. cit., pp. 158-9.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Jun 2010
    • Data do Fascículo
      2000
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